Coordenador do Nucrim, defensor Daniel Faleiros Calemes, durante workshop do projeto Acolhida em outubro de 2023. (Foto: Danielle Valentim)
Texto: Danielle Valentim
No dia 23 de fevereiro de 2021, a Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul instituiu e regulamentou em âmbito estadual o Núcleo Institucional Criminal, o Nucrim. Hoje faz três anos que a atuação de defensoras e defensores públicos — na defesa dos direitos de pessoas com demandas na área criminal — avançou em dados, uniformidade e articulações.
Como disposto na Resolução DPGE n.º 239, de 23 de fevereiro de 2021, a função primordial do Núcleo é garantir a atuação harmônica a assistidas e assistidos do inquérito policial à revisão criminal, bem como, nas audiências de custódia e acordos de não-persecução penal (ANPP’s).
Nestes três anos de história, o coordenador do Nucrim, defensor público Daniel Faleiros Calemes, destaca o avanço em dados, considerando o projeto de pesquisas já consolidado, e as deliberações concretizadas a partir de articulações com diversos órgãos.
“O Nucrim, apesar de ter sido recentemente instituído, já deixou uma marca significativa na defesa criminal, demonstrando sua relevância e destaque na busca pela justiça. Neste período, várias pesquisas e levantamentos estatísticos foram realizados, transformando números de atuações em recortes que mostram o verdadeiro rosto de nossas assistidas e assistidos. Além disso, articulamos e participamos de comissões e eventos da área criminal, bem como de inspeções e apoio técnico a defensoras e defensores do Estado. Nosso compromisso com a defesa criminal tem sido evidenciado pela atuação proativa da Defensoria nestes debates, e estas iniciativas têm sido fundamentais para a implementação de políticas públicas e garantia de humanização em ambientes penais. Estes avanços demonstram a força e importância do núcleo e revelam que novas práticas exitosas virão pela frente”, pontua o coordenador.
A Regulamentação
A regulamentação do Nucrim considerou a necessidade de projetos e estratégias de prevenção da criminalidade e, principalmente, a Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica). O Nucrim sempre foi um anseio de defensoras e defensores públicos para garantir um trabalho mais integrado entre os membros na área criminal, além da promoção de debate de teses defensivas e um atendimento mais estruturado à população.
À época, o defensor público-geral Fábio Rogério Rombi da Silva designou como primeiro coordenador do Nucrim o defensor público Anderson Chadid Warpechowski. O segundo coordenador foi o defensor público Gustavo Pinheiro, atualmente adido ao gabinete.
Atuação da Defensoria em audiência de custódia.
Referência
Foram “na unha” que saíram as primeiras pesquisas do Nucrim. Os números com recortes sociais deram visibilidade a problemas históricos de Mato Grosso do Sul.
Com muita persistência, o projeto de dados do Nucrim se consolidou e hoje é referência em publicações inéditas sobre a população hipervulnerável que passa por audiências de custódia e recebem assistência da Defensoria Pública em Campo Grande.
A primeira pesquisa divulgada pelo núcleo, em agosto de 2021, revelou que, mesmo durante a pandemia, era baixo o uso de medidas cautelares diversas à prisão. No período, 88% das prisões foram em razão de atos cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa. Além disso, 69% envolviam pessoas primárias. Em outubro do mesmo ano, pesquisa mostrou que 79% das pessoas custodiadas não tinham sequer concluído a educação básica.
Em 2022, pesquisas do Nucrim apontaram que em quase 2 anos, 71,5% das pessoas que passaram por audiências de custódia em Campo Grande eram negras.
Já em 2023, dados destacaram que em 1 ano, quase 300 pessoas que passaram por audiência de custódia na Capital estavam em situação de rua.
“Em 2023, o Nucrim apresentou diversos estudos estatísticos na área criminal, tais como: pesquisa sobre as mães no cárcere; estudo a respeito de furtos famélicos; e, inclusive, de forma inédita, um levantamento referente a pessoas em situação de rua que passaram pela audiência de custódia”, pontua o coordenador.
Confira!
Articulações
Após inúmeras reclamações - de pessoas apresentadas para audiência de custódia em Campo Grande - o Nucrim garantiu a retomada da entrega de insumos emergenciais mínimos, como vestimentas e chinelo.
O coordenador do Nucrim, defensor público Daniel Calemes, explica que diante das reivindicações da falta das entregas dos insumos, realizou reuniões e encaminhamentos de ofícios.
Integrante do Conselho Estadual de Segurança Pública, o Nucrim também sugeriu a inclusão no Plano Estadual de Segurança Pública um seguimento específico para monitoramento das mortes por intervenção policial.
O Nucrim garantiu, ainda, a inclusão de uma pessoa no Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas (Provita). A ação aconteceu em setembro, dois meses após o lançamento da cartilha criada pelo núcleo para auxiliar defensoras e defensores públicos.
O coordenador explica que a pessoa estava em situação de rua quando buscou a ajuda da Defensoria. A partir daí, foi iniciada uma articulação com o programa de proteção de outro estado, bem como com o Ministério Público e delegacias de Polícia Civil.
Atuação do Nucrim durante operação da Polícia Civil no "Carandiru" em 2023. (Foto: Guilherme Henri)
Jurisprudência
Por meio de informativos e boletins, o Nucrim tem destacado o trabalho incansável de defensoras e defensores, de primeira e segunda instância, além de contribuir para a divulgação de jurisprudência.
Em 2023, o Núcleo finalizou um guia para auxiliar defensoras e defensores diante de casos que necessitem do Programa de Proteção a Testemunhas e Colaboradores.
“Dois meses depois do lançamento do guia atuamos de forma eficaz em um caso que envolveu dois estados. É gratificante ver que, graças ao trabalho dedicado entre primeira e segunda instância, os avanços alcançados em Mato Grosso do Sul nos últimos três anos têm se tornado uma referência nacional”, pontua o coordenador do Nucrim.
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Atendimentos - O Núcleo Institucional Criminal registrou, em 2023, mais de 11,6 mil atendimentos em Campo Grande (11.611) e mais de 40 mil em todo o Estado (40.634).
A quantidade aumentou 27,9% com relação a 2022, quando o núcleo teve aproximadamente 10 mil atendimentos em Campo Grande e 32 mil em todo o Estado.
Além das pesquisas, outro destaque em 2023 foi a atuação em favor dos moradores do Residencial Athenas, conhecido como Carandiru, que foram alvo da operação Abre-te-Sésamo. Na ocasião, o Núcleo atuou na inspeção in loco e atendimento de pessoas.
O Nucrim encerrou o ano com a divulgação de um estudo sobre racismo estrutural e os reflexos no sistema penitenciário. Os dados foram apurados em parceria com a Coordenadoria de Pesquisas e Estudos e apontaram que 75% das pessoas que passaram por audiência de custódia em Campo Grande, no ano de 2023, eram negras.