Feijão servido em um dos presídios de MS. (Foto: Arquivo/Nuspen-DPMS)
Texto: Danielle Valentim
Em uma decisão recente que reforça os direitos humanos, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a recusa de alimentos por detentos, quando considerados impróprios para consumo, não constitui uma falta grave. Para a Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso do Sul, a decisão dá correta interpretação ao art. 50, I da Lei de Execuções Penais e reflete a dignidade humana.
Segundo a Lei de Execução Penal, constitui falta grave a incitação ou participação de reenducandos em movimentos que ameaçam a ordem ou disciplina prisional. No entanto, a simples recusa de alimentos inadequados, realizada pacificamente, não deve ser enquadrada nessa falta grave, principalmente se for realizada de forma pacífica e sem ameaçar a segurança do ambiente carcerário.
Esta interpretação é reforçada pelo art. 5º, IV, da Constituição, que garante a liberdade de expressão, e pelo art. 41 da Lei de Execução Penal, que assegura aos detentos o direito à alimentação adequada e assistência à saúde.
Defensor Bruno Grassani. (Foto: Danielle Valentim)
O defensor público Bruno Bertoli Grassani, titular da 1ª Defensoria Pública da Infância e Juventude, ressalta que um tratamento minimamente digno é fundamento do Estado democrático de direito (art. 1º, inciso III, da CF).
“Punir pessoas que, sobre a óptica legal e constitucional, manifestam-se por não serem tratadas de maneira digna, seria um enorme contrassenso. Esta decisão reafirma o compromisso do sistema jurídico brasileiro com a proteção dos direitos fundamentais e a dignidade dos detentos. Por fim, trago uma citação de Nelson Mandela: Uma nação não deve ser julgada pela forma como trata seus cidadãos mais elevados, mas sim pelos mais baixos”, destaca o defensor.
Defensor Rodrigo Compri durante inspeção em presídio de MS. (Foto: Arquivo/Nuspen-DPMS)
Para o defensor público Rodrigo Vasconcelos Compri, titular da 3ª Defensoria Pública Criminal de Dourados, a decisão proferida pelo STJ é de extrema importância pelo caráter pedagógico a todas as pessoas que trabalham no sistema prisional, considerando a quantidade aplicação de faltas graves genéricas e muitas vezes sem qualquer individualização de conduta.
“A decisão, além de decidir o óbvio, isto é, que as pessoas privadas de liberdade não são obrigadas a aceitarem alimentos impróprios para consumo, ainda delimita de maneira clara que só há falta grave em caso de ato praticado para o fim de desestabilizar a ordem ou a disciplina da unidade prisional. É uma decisão em total consonância com a Constituição Federal. Além disso, espera-se maior respeito à obrigatoriedade de assistência material e à saúde do detento, uma vez que é obrigação estatal proporcionar alimentação adequada e suficiente nos presídios, por se tratar de direito humano fundamental e uma condição para o exercício de outros direitos”, pontua o defensor.
Ainda em sua consideração, o defensor ressalta a importância do papel da Defensoria Pública e de outros órgãos estatais de defesa dos Direitos Humanos, que tem a missão de denunciar situações de violação à alimentação adequada dos presos, além de exigir do Estado o cumprimento de suas obrigações constitucionais.
Defensores durante inspeção em presídio de MS. (Foto: Arquivo/Nuspen-DPMS)