Texto: Danielle Valentim
A coletiva de imprensa anual da Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul revelou um dado expressivo sobre pedidos de laqueadura em Campo Grande no ano de 2023. Conforme o Núcleo Institucional de Promoção e Defesa da Mulher (Nudem) foram contabilizadas 37 solicitações, uma delas de Fabíola Brunetto França, de 38 anos, gestante de risco no terceiro filho, que teve o pedido negado mesmo se enquadrando nos parâmetros legais.
Segundo a coordenadora do Nudem em exercício, a defensora pública Edmeiry Broch Festi, é possível que a lacuna no cumprimento integral da lei 14.443/2022 se deva à recente mudança. Além disso, o processo a ser percorrido pela mulher representa outro obstáculo para a aplicação da lei.
“Como a legislação foi modificada recentemente, há ainda grande desconhecimento e não desinteresse da administração pública em cumprir. No entanto, há muito preconceito por parte dos profissionais, e aí entra toda a questão religiosa, imposição de dificuldades. De outro lado o processo depende de várias etapas (UPA, consultas, encaminhamentos, palestras, atendimento multidisciplinar, marcação de nova consulta e, por fim, a marcação da cirurgia), isso também pode se tornar uma dificuldade, ao demandar tempo e persistência da mulher”, destaca a defensora.
Algumas das principais mudanças do novo texto são a redução da idade mínima para a esterilização voluntária, a liberação para pessoas sem filhos (com a idade mínima) e não ser mais exigido o consentimento por parte do parceiro.
A assistente social do Nudem, Elaine França, é quem atende, orienta e faz o acompanhamento do processo que a mulher percorre, e a assistida Fabíola foi uma delas em 2023.
“Assim que elas chegam na unidade, eu verifico onde esse pedido está parado, porque às vezes, a gestante fez todo o pré-natal, mas não fez a palestra. Às vezes o pedido ficou parado no Sisreg. No caso da Fabíola ele perderia o prazo, porque a gestante precisa se manifestar 60 dias antes”, pontua a assistente social, que integra a equipe multidisciplinar do Nudem.
Correndo contra o tempo, a assistida Fabíola, moradora do bairro Tijuca, procurou a Defensoria por meio da unidade localizada no Fácil Aero Rancho. A laqueadura foi intermediada pela Defensoria e Luiz Fernando, seu último filho, acaba de completar oito meses de vida.
“Por iniciativa minha percebi que teria que procurar a justiça, porque era minha terceira gestação de risco e mesmo com o planejamento familiar, o médico negou meu pedido alegando que eu não estava nos padrões. Do jeito que saí da consulta, porque eu estava fazendo o pré-natal no Rosa Pedrossiam, fui ao Fácil. A atendente pegou meus dados e depois já entreguei as documentações no Nudem. Depois de 10 dias corridos, me ligaram e informaram para eu voltar no Médico do Cem, que ele me daria o papel autorizando a laqueadura”, relata a assistida.
O Nudem realizou 4880 atendimentos neste ano. O número representa um aumento de 12% no comparativo com o ano passado, que teve 4.339. E mesmo diante das diversas áreas de atuação, a saúde reprodutiva da mulher ainda chama a atenção.
Garantir que o direito a laqueadura seja efetivado é uma das funções da Defensoria e, portanto, também é debatido no projeto de capacitação da Rede de Enfrentamento à Violência Contra As Mulheres: Desafios e Possibilidades no Atendimento”, realizado por meio de termo de cooperação com o Governo de MS.
A iniciativa fez reuniões presenciais atingindo a rede dos 79 municípios do Estado e até o momento já registrou mais de 200 participantes. O cumprimento da lei 14.443/2022 será uma das prioridades do Nudem para 2024.