Foto: Beatriz Magalhães.
Texto: Danielle Valentim
No dia 18 de maio de 2015, a Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul instituiu e regulamentou em âmbito estadual, o Núcleo Institucional de Promoção e Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, o Nudeca. Hoje faz oito anos que a atuação transformadora de defensoras e defensores públicos - na defesa dos direitos de crianças e adolescentes - ganhou uniformidade e aperfeiçoamento.
Como disposto em sua resolução de criação, a função primordial do Núcleo é garantir a atuação harmônica na proteção e defesa dos direitos da criança e do adolescente em todo o Estado.
É considerando essa atribuição e trabalho hercúleo entre primeira e segunda instância, que os avanços sul-mato-grossenses, em quase uma década, se tornam referência no país.
Com o apoio multidisciplinar de profissionais da Psicologia e Assistência Social, os atendimentos desta população, intitulada futuro de toda a humanidade, recebe a defesa jurídica de forma técnica, protegida e humanizada.
Conquistas, Referência e Jurisprudência
O avanço mais recente foi a integração do Nudeca no comitê de articulação para criação e instalação do Centro Integrado de Atendimento de Crianças e Adolescentes vítimas de violência em MS.
“Estamos acompanhando e articulando isso já algum tempo pela Defensoria e pelo Nudeca para que esse Centro realmente seja efetivado. E agora neste evento conseguimos reunir todos os integrantes da rede e poder público e intuições que têm interesse na criação desse centro, para que consigamos dar um melhor atendimento para nossas crianças e adolescentes”, pontua a coordenadora.
Também se destacam, o progresso no atendimento jurídico e participação processual de crianças e adolescentes vítimas de violência, bem como, a articulação para fortalecimento da rede de proteção de direitos da criança e adolescente.
Também foi o olhar do Nudeca, sob coordenação da defensora pública Débora Paulino, que jogou luz à situação de centenas de crianças e adolescentes órfãs e vítimas secundárias do feminicídio. Um estudo em parceria com o Nudem iniciado, em 2019, pouco antes da pandemia observou que mulheres vítimas de feminicídio ou tentativa desta qualificadora eram mães de crianças e adolescentes.
Durante a defesa dessas famílias, a equipe psicossocial do Nudeca encontrava dificuldade para encaminhar as vítimas secundárias, agora também órfãs, aos serviços públicos de acompanhamento, meramente, por não existir um direcionamento estabelecido.
O Procedimento de Apuração Preliminar (PAP) - nº 023/2019 - foi instaurado para verificar a eventual ausência de prestação do serviço de acompanhamento psicológico. Tal medida motivou a criação de lei municipal, lei estadual e jurisprudência para futuras defesas.
Em abril de 2022, entrou em vigor em Campo Grande a Lei nº 6.801, que instituiu o Programa Órfãos do Feminicídio: Atenção e Proteção, visando a proteção de órfãos do feminicídio e seus responsáveis legais, em Campo Grande.
Em outubro do mesmo ano, o governo sancionou a Lei 5.962/2022 que estabelece seis princípios norteadores de políticas públicas voltadas ao atendimento especializado aos órfãos do feminicídio, para o atendimento especializado aos órfãos do feminicídio, no âmbito do Estado de Mato Grosso do Sul”. O texto trouxe regulamentação ao protocolo da Defensoria iniciado em 2019.
Júri emblemático e precedentes - A Defensoria Pública de MS atuou como assistente de acusação em júri emblemático de um caso concreto, que abriu caminho para a criação da Lei a favor de órfãos do feminicídio no Estado.
A atuação em plenário foi da defensora pública do Nudem, Edmeiry Silara Broch Festi. O soldador Adailton Freixeira da Silva, de 46 anos, foi condenado a 24 anos e 2 meses de prisão pelo assassinato da esposa, Francielli Guimarães Alcântara, de 36 anos, que passou quase um mês sendo torturada, em sessões de violência que, antes de lhe levarem a vida, resultaram em dentes quebrados, perda da pele das nádegas por queimaduras devido a choques e perfurações de faca.
A mulher foi encontrada morta em 26 de janeiro, em residência do Bairro Portal Caiobá. Na época, a vítima deixou dois filhos, um com 1 ano e 8 meses e outro de 17 anos.
“Uma tragédia anunciada, como na maioria das vezes, agravada pela tristeza de deixar sem mãe uma criança com menos de dois anos de idade. Pelo Nudem atuamos na defesa da memória da vítima e na defesa da verdade ao longo do processo criminal, inclusive no plenário do júri”, destacou a defensora pública Edmeiry.
Atendimentos- De acordo com a coordenação do Nudeca, no comparativo 2021/ 2022, Campo Grande registrou aumento de quase 3 mil novos casos, considerando que em 2021 o núcleo teve 3.782 atendimentos e, no ano passado, o número saltou para 7.970.
A coordenadora explica que houve um aumento expressivo nos atendimentos referente a vagas em EMEI’s e escolas públicas. Em 2022 foram realizados quatro mutirões virtuais e três presenciais com a proposta de minimizar a situação na Capital. As demandas nessa área somaram 3.039 atendimentos e 2.057 ações ajuizadas. De fevereiro a abril de 2023, o Nudeca já realizou sete mutirões, em Campo Grande e Dourados, com o atendimento de mais de 1000 famílias.
Em 2022 chamou a atenção do núcleo, ainda, casos de crianças e adolescentes vítimas de violência sexual e maus tratos. Ao todo o núcleo registrou 85 atendimentos relacionados a esses crimes.
Onde atuam? Quando atuam? Em que circunstância?
Defensoras e defensorias públicos da infância e juventude atuam em favor dos direitos da criança e do adolescente em razão de qualquer conduta praticada mediante violência física ou psíquica, abuso de direito, maus-tratos, exploração ou abuso, sofrimento físico ou moral, e que de algum modo viole a autonomia, a dignidade, o direito à vida, a integridade física ou psíquica e as necessidades de qualquer criança ou adolescente.
A atuação é garantida ainda que tais condutas tenham ocorrido de dentro da família; na comunidade; em órgãos, entidades ou por seus agentes públicos; seja decorrente de indução ao consentimento da criança ou adolescente, no âmbito da alienação parental; Ademais que tais ações tenham objetivo de oferta das vítimas a fins de exploração sexual infanto-juvenil; trabalho forçado ou até mesmo tráfico da criança e adolescente.
“Estar na linha de frente como coordenadora de um Núcleo como o Nudeca, é um desafio diário, principalmente pela busca de garantir que os direitos de nossas crianças sejam respeitados e que sejam tratadas efetivamente como sujeitos de direitos. Apesar de desafiador, é um trabalho muito gratificante. Sou grata pela oportunidade”, finaliza a coordenadora do Nudeca, defensora Débora Paulino.