Por: Carla Gavilan Carvalho Nantes
Há poucas semanas para completar 38 anos de existência, a Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso do Sul lança a campanha “Inteligência a serviço da população! Inteligência artificial, Defensoria Pública digital”.
A primeira etapa dessa audaciosa jornada, que inicia a transição para uma nova era, teve início com a disponibilização do portal de atendimento online dia 4 de maio. Basta acessar o site www.defensoria.ms.def.br, clicar no banner “Precisa de atendimento?”, registrar sua demanda e, em até 48h, a Defensoria Pública entra em contato telefônico com o usuário do serviço. Desde o lançamento, a plataforma já registrou 7.591 atendimentos, ou seja, uma média de quase onze atendimentos por hora, o que demonstra seu sucesso principalmente agora em tempos de distanciamento social.
Dentre as assistidas da Defensoria Pública nesse período de pandemia, está uma mãe, que prefere não ser identificada, que buscou a ferramenta de atendimento online para conseguir a pensão alimentícia para seu filho. “Fiz o pedido da minha própria casa, sem precisar sair e me retornaram com as informações. Agradeço o atendimento rápido, vai fazer diferença na vida do meu filho. Parabéns a equipe. Vocês estão fazendo a diferença na vida das pessoas”, registrou a assistida na plataforma de atendimento.
O público atendido pela Defensoria Pública é muito heterogêneo, próprio de uma sociedade onde os níveis de desigualdade social ainda são enormes. Há desde pessoas analfabetas até aquelas com curso superior completo, mas desempregadas ou com baixa remuneração. O mesmo se diz em relação ao acesso à tecnologia. Há desde quem não tem ou não sabe usar um smartphone, por exemplo, até quem já nasceu inserido no mundo tecnológico.
Defensor público-geral, Fábio Rogério Rombi da Silva.
“O objetivo não é acabar com o atendimento presencial, eis que muitas pessoas só conseguem acessar nossos serviços dessa forma. O que queremos é disponibilizar também meios para o atendimento remoto de quem já consegue usar essa via. Por isso, em breve disponibilizaremos a ‘área do assistido’, que permitirá ao usuário do serviço acompanhar o andamento dos seus pedidos, processos e orientações em um único espaço virtual. Nossos assistidos costumam ter demandas em mais de uma área. Para ilustrar, é muito comum uma pessoa requerer pensão alimentícia para o filho e também vaga em uma creche. Apesar de ambas pretensões dizerem respeito a mesma criança, isso gera processos em áreas jurídicas diferentes, que o responsável legal precisa acompanhar e tudo estará disponível via internet”, explica o defensor público-geral, Fábio Rogério Rombi da Silva.
A Defensoria Pública trabalha também no lançamento de um aplicativo ainda em 2020 para permitir ao assistido interagir em tempo real com a instituição através do seu aparelho de telefone celular.
Todas essas novas ferramentas são desenvolvidas pela Secretaria de Tecnologia da Informação da própria Defensoria Pública.
“Paralelo a tudo isso, estamos também trabalhando na construção de uma base de conhecimento, que é o caminho para otimizar a interação entre o assistido e o defensor público, permitindo respostas e orientações rápidas. Esse é o passo para desenvolver, no futuro, a inteligência artificial, conhecida pelas iniciais IA, recurso que permitirá à máquina buscar naquela base de conhecimento casos semelhantes, pesquisar doutrina e legislação aplicáveis, analisar os resultados obtidos em sentenças e adaptar tudo isso ao caso concreto, de modo a auxiliar o defensor público na identificação do melhor caminho para solucionar o problema apresentado pelo assistido, tudo isso em um tempo infinitamente menor do que a inteligência humana seria capaz de fazer”, explica o diretor da Secretaria de TI, Evandro Higuchi.
“Essa mudança de paradigma é algo que já estávamos avaliando e, inclusive, foi uma pauta discutida na primeira reunião de trabalho da nossa gestão, em novembro do ano passado, porque entendemos que essas tecnologias fazem parte de uma realidade irreversível e que, naturalmente, temos de nos adaptar a ela. O início dessa mudança, que seria mais longo, contudo, foi acelerado devido à pandemia da covid-19. O que viria mais para frente, a necessidade nos impõe iniciar agora”, detalha o defensor público-geral, Fábio Rogério Rombi da Silva.
Inteligência Artificial (IA) - Defensoria Digital
A modernização nos processos de atendimento à população também é um assunto que já despertava grande interesse do defensor público Paulo Diniz Martins Brum, que inscreveu o tema “Inteligência a serviço da população! Inteligência Artificial, Defensoria Pública Digital” para concorrer na Campanha Institucional Anual da Defensoria Pública do Estado de MS, em dezembro de 2019. A proposta venceu a seleção, com votação realizada pelo Conselho Superior da Defensoria Pública em fevereiro deste ano, e receberá publicidade em todos os canais de comunicação da instituição junto à sociedade.
Defensor público Paulo Diniz Martins Brum.
“Vivemos uma nova era, com profundas transformações em nossas vidas. O presságio foi registrado nas eleições dos EUA, em que um terço da população foi influenciado pela internet. Quando observamos o que temos conseguido realizar nesse momento de pandemia, avaliamos a importância das ferramentas disponibilizadas pela Defensoria Pública de MS que, aliadas à atuação dos defensores e defensoras, estão dando respostas céleres aos cidadãos em um período tão delicado”, comenta o defensor público Paulo Diniz Martins Brum.
De blocos de papel e máquina de datilografar à IA
Ao comentar sobre essa grande mudança no atendimento da instituição, o defensor público-geral reflete a respeito do protagonismo histórico da Defensoria Pública de MS.
Criado em outubro de 1977, a partir da desvinculação de Mato Grosso, O Estado de Mato Grosso do Sul desde 1º de julho de 1982, com a edição da lei nº 343, organizou a Assistência Judiciária do Estado como órgão integrante do Sistema Estadual de Justiça e com a missão de atender e representar em todas as instâncias os “juridicamente necessitados”.
“Ao tomar a decisão política de criar a Assistência Judiciária, precursora da atual Defensoria Pública, o então governador Pedro Pedrossian foi um homem visionário na criação de uma carreira voltada exclusivamente para atender pessoas que não tinham condições de pagar por um advogado, e isso em uma época na qual ninguém pensava ainda nisso”, avalia.
Ex-Governador de MS, Pedro Pedrossian.
Ainda em 1982 foi autorizada a realização do primeiro concurso, do qual resultou a aprovação de 33 assistentes judiciários, cargo que depois da Constituição Federal de 1988 passou a ser chamado de defensor público.
Defensora pública Carmen Lúcia Trindade Dutra (Arquivo pessoal)
Defensora pública há 37 anos, Carmen Lúcia Trindade Dutra, única remanescente daquele primeiro concurso ainda em atividade, recorda como eram os atendimentos. “Nós fazíamos todas as petições em um bloco de papel e, depois, quem tinha, em uma máquina de datilografar. Nós levávamos, de Campo Grande para as comarcas do interior, um monte de livros para consultar porque, como não existia internet, era o nosso meio de consultar os códigos”, conta a defensora pública ao recordar dos atendimentos em Aquidauana.
Defensor público de Segunda Instância, Francisco José Barroso.
A transição dos blocos de papel e máquina de datilografar para o computador é importante marco na carreira do defensor público de segunda instância Francisco José Soares Barroso. “Foi uma adaptação gradual, pois, quando os computadores foram lançados, a Defensoria Pública tinha uma estrutura muito precária e fomos adquirindo por conta própria nossos computadores. Adquiri meu primeiro computador quando vim de Corumbá para Campo Grande e a diferença, no dia a dia, era incrível. O que hoje é rápido e fácil, antes, era bem difícil. As pesquisas, por exemplo, demandavam muito tempo da nossa rotina, percorríamos os índices dos livros, buscávamos atualizações de outras formas que somavam uma significativa parte do nosso trabalho. É extraordinário o que a informática promove hoje”, diz o defensor público de segunda instância.
Para o defensor público-geral, “uma nova Defensoria Pública está surgindo, pois o atendimento presencial caminhará junto com o atendimento remoto, que ganhará cada vez mais adesão do público, e o próprio trabalho intelectual dos membros da instituição será cada vez mais potencializado conforme o desenvolvimento da IA for ser tornando realidade no dia-a-dia. Dentro de uma década olharemos para 2020 e indagaremos: como conseguíamos trabalhar daquele jeito?”, finaliza o defensor público-geral, Fábio Rogério Rombi da Silva.