A Defensoria Pública garantiu a contratação de um homem que havia sido impedido de ingressar em um cargo público por não estar com a quitação eleitoral em dia. O assistido cumpria pena em regime aberto e por esta razão estava com os seus direitos políticos suspensos.
No início deste ano, o impetrante inscreveu-se no cadastro de candidatos à professor temporário de matemática para exercício na rede estadual de ensino e em programas e projetos educacionais em Ponta Porã e foi selecionado e investido na função no dia 6 de fevereiro.
Acontece que no dia 14 do mesmo mês foi informado que sua contratação fora negada pela Secretaria Estadual de Educação em razão do não atendimento ao item IV do artigo 5° da Resolução/SED/ n. 3.400, de 22 de janeiro de 2018, que obriga a apresentação de certidão de quitação eleitoral.
Ocorre que o impetrante não tinha como apresentar a quitação eleitoral, porquanto estava em cumprimento de pena, em regime aberto, e a suspensão dos seus direitos políticos persistiria até que sua pena fosse integralmente cumprida. Visto o problema, o professor buscou a Defensoria Pública, que impetrou um mandando de segurança pedindo a inexigência do documento.
A judicialização foi feita pela defensora pública substituta Sara Zam Segura Marçal, que pontuou que ele já fora contratado pela rede estadual em 2016, sem nenhuma restrição, sendo que à época cumpria pena e, como atualmente, encontrava-se com seus direitos políticos suspensos.
“Durante todo o tempo de contratação o assistido apresentou Carta de Emprego ao Juízo da Execução, comprovando que trabalhou na Escola Estadual Pedro Afonso Pereira Goldoni sem qualquer problema. A própria escola emitiu parecer favorável à contratação, manifestando interesse em sua permanência como professor haja vista que durante todo o período que lecionou prestou excelente trabalho”, afirmou a defensora.
Segundo a defensora, a não admissão fere o direito assegurado constitucionalmente ao trabalho, conforme dispõe os arts. 6º e 205, da Constituição Federal, e que exigências, ainda que amparadas em Portarias, Editais e Resoluções, não estão em simetria com a Carta Política.
O mandado de segurança destaca que não há qualquer lei exigindo de uma pessoa que pretende trabalhar como professor temporário a quitação eleitoral, não podendo um edital ou uma resolução fazê-la.
Outro ponto importante está elencado na Lei de Execução Penal, que em seu artigo 1º assevera que “a execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”, sendo a educação e o trabalho os meios mais eficazes de ressocialização do condenado.
De acordo com a defensora, a opção do trabalho como meio ressocializador e de integração social do condenado é incentivada pela própria Lei 7.210/84. “Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena”.
Além de prejudicar ao próprio assistido, a negativa da Secretaria de Educação prejudicou os alunos, que ficaram sem aula durante o tempo em que o professor esteve afastado.
O juízo de primeiro grau negou a liminar e a Defensoria Pública conseguiu garantir o direito do assistido em decisão do Tribunal de Justiça.
A justificativa da juíza de Ponta Porã foi sob o argumento de que “o poder público reveste-se de maior zelo e exige-se do candidato o preenchimento de determinados requisitos, dentre eles estar no gozo da plenitude dos direitos políticos, os quais são suspensos por força de condenação criminal transitada em julgado, nos exatos termos propugnados na Constituição Federal e impedem a expedição da quitação eleitoral”.
Em seu agravo de instrumento, a defensora pontuou a contradição da decisão. “A negativa do Poder Público e do Juízo, portanto, mostra-se no mínimo contraditória, haja vista que o Estado Brasileiro fundamentado na dignidade da pessoa humana, ao negar ao cidadão o seu direito ao trabalho baseando-se em norma infraconstitucional, sob o argumento de que a contratação com o poder público exige mais zelo, nega vigência à sua própria razão de ser. Sim, porque se a pena aplicada ao reeducando objetiva a sua ressocialização, sendo que a Lei de Execução Penal impõe que o trabalho realizado pelo reeducando constitui direito e um dever, conforme se observa dos artigos 28 até 37 do referido Diploma Legal, impedir o cidadão de fazê-lo é o mesmo que condená-lo a reincidência e, assim, ver desmoronar a própria base do Estado Democrático de Direito”.